Institui a Política Marítima Nacional.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso das atribuições que lhe confere o art. 84,caput, incisos IV e VI, alínea “a”, da Constituição, e tendo em vista o disposto na Lei nº 9.537, de 11 de dezembro de 1997, e na Lei nº 9.966, de 28 de abril de 2000,
D E C R E T A :
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 1º Fica instituída a Política Marítima Nacional – PMN, a ser implementada de forma articulada pelos órgãos e pelas entidades da administração pública federal, direta e indireta, respeitadas as competências estadual, distrital e municipal.
Parágrafo único. A União orientará os entes federativos para que considerem a PMN em seus planejamentos e suas ações.
Art. 2º A PMN abrange as atividades relacionadas ao uso:
I – do mar, do leito e do subsolo marinhos contidos na extensão atlântica que se projeta a partir do litoral até o limite exterior da plataforma continental brasileira;
II – das ilhas costeiras e oceânicas;
III – das águas interiores, conforme previsto no art. 3º,caput, inciso I, da Lei nº 9.966, de 28 de abril de 2000; e
IV – de outras áreas marítimas e marinhas de interesse nacional.
Art. 3º Para fins do disposto neste Decreto considera-se:
I – Amazônia Azul – espaço marítimo do País, compreendidos o mar, o leito e o subsolo marinhos, na extensão atlântica que se projeta a partir do litoral até o limite exterior da plataforma continental brasileira;
II – consciência situacional marítima – compreensão de fato ou circunstância associada aos ambientes marinho, marítimo e fluviolacustre que seja relevante para a segurança marítima, a economia ou a proteção do meio ambiente;
III – economia azul – práticas que visem à exploração responsável e equilibrada dos oceanos, com ênfase na conservação da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos, na sustentabilidade e na justiça social, garantidos a preservação dos oceanos, o desenvolvimento econômico e a distribuição justa dos benefícios para as comunidades costeiras e dependentes dos recursos marinhos;
IV – fluviolacustre – aquilo que se origina ou esteja junto às águas interiores, de origem natural ou antrópica;
V – marinho – aquilo que tem origem no mar, que pertence ao ecossistema do mar, ou que serve à navegação no mar;
VI – marítimo – aquilo que está junto ao mar, que nele é posto pelo ser humano ou que esse realiza no mar;
VII – mentalidade marítima – modo de pensar sobre a importância do mar e das águas interiores para a vida dos brasileiros e para o desenvolvimento nacional;
VIII – poder marítimo – recursos de que dispõe o Estado para a utilização do mar e das águas interiores como instrumento de ação política e militar e como fator de desenvolvimento econômico, tecnológico e social;
IX – poder naval – parte integrante do poder marítimo capacitada a atuar militarmente no mar, em águas interiores e em áreas terrestres de interesse para as operações navais, incluído o espaço aéreo sobrejacente;
X – proteção marítima – conjunto de operações destinadas à fiscalização do cumprimento de leis e regulamentos, e à prevenção e à repressão de atos ilícitos ou ameaças no mar, nas águas interiores, na Amazônia Azul e em outras áreas marítimas de interesse nacional; e
XI – embarcação de bandeira brasileira – embarcação inscrita no Registro de Propriedade Marítima brasileiro ou no Registro Especial Brasileiro.
CAPÍTULO II
DOS PRINCÍPIOS, DOS OBJETIVOS E DAS ORIENTAÇÕES ESTRATÉGICAS
Art. 4º São princípios da PMN:
I – a defesa da soberania do Estado brasileiro, especialmente sobre os recursos existentes na zona econômica exclusiva e na plataforma continental brasileiras;
II – a garantia da segurança no mar e nas águas interiores;
III – o desenvolvimento sustentável, com vistas ao bem-estar humano e à conservação dos serviços ecossistêmicos;
IV – o respeito aos compromissos internacionais assumidos pelo País;
V – o incentivo à cooperação internacional para o uso pacífico do mar, especialmente no Atlântico Sul;
VI – a cooperação entre entidades públicas e privadas para o desenvolvimento da economia azul;
VII – o estímulo ao fortalecimento do registro de embarcações e trabalhadores no País para atuação no transporte aquaviário;
VIII – o estímulo ao emprego e à qualificação da mão de obra brasileira, com respeito à igualdade de gênero, e ao enfrentamento a todas as formas de discriminação e de violência; e
IX – a garantia de uso dos recursos naturais aquáticos de forma equilibrada pelos pescadores.
Art. 5º São objetivos da PMN:
I – assegurar o exercício da soberania brasileira e coibir atos ilícitos e ameaças nos espaços previstos no art. 2º, conforme as seguintes orientações estratégicas:
a) desenvolvimento contínuo das instituições civis e militares destinadas à proteção marítima, incluídas sua integração e sua cooperação;
b) aprimoramento das capacidades necessárias ao Sistema Nacional de Mobilização, de que trata a Lei nº 11.631, de 27 de dezembro de 2007;
c) desenvolvimento da infraestrutura necessária nas ilhas oceânicas;
d) promoção da cooperação internacional com vistas à proteção marítima, à prevenção, à reação e à repressão de atos ilícitos e outras ameaças; e
e) aperfeiçoamento da proteção das infraestruturas críticas, observado o disposto no Anexo ao Decreto nº 10.569, de 9 de dezembro de 2020;
II – fortalecer a posição do País como ator marítimo influente no cenário internacional, em particular no Atlântico Sul, conforme as seguintes orientações estratégicas:
a) estímulo à presença nacional em áreas marítimas de interesse, de acordo com a Política Nacional de Defesa e as diretrizes da política externa brasileira;
b) atuação proativa nacional em organismos e foros internacionais relacionados a temas marítimos, marinhos e fluviolacustres;
c) fortalecimento da cooperação em proveito da segurança marítima, em especial com os estados lindeiros do Atlântico Sul;
d) ampliação do engajamento do País em atividades polares, especialmente na Antártica, na forma do disposto no Decreto nº 11.096, de 15 de junho de 2022; e
e) promoção da Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul, instituída por meio da Resolução nº 41/11, da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, de 27 de outubro de 1986;
III – incrementar a segurança marítima nos espaços previstos no art. 2º, conforme as seguintes orientações estratégicas:
a) aperfeiçoamento de sistemas, capacidades e infraestruturas responsáveis pela defesa, pela operação e pela segurança do tráfego aquaviário, incluídos os auxílios à navegação e à geoinformação marinha e fluviolacustre;
b) aprimoramento e integração de informações de navegação e de serviços relacionados à proteção marítima, à segurança do tráfego aquaviário e à conservação dos ambientes marinho e fluviolacustre;
c) incremento de medidas para prevenção, resposta e adaptação, mitigação e reparação de desastres ambientais, efeitos das mudanças do clima ou atividades humanas que venham a impactar negativamente nos ambientes marinho, costeiro e fluviolacustre;
d) estímulo às medidas de controle e de redução da geração de resíduos sólidos e das emissões de poluentes pelo transporte aquaviário; e
e) fortalecimento da consciência situacional marítima;
IV – difundir e incentivar o conhecimento sobre a importância do mar, da zona costeira, dos ambientes fluviolacustres e da economia azul para o desenvolvimento nacional, com vistas a fortalecer a mentalidade marítima, conforme as seguintes orientações estratégicas:
a) difusão dos conceitos de Amazônia Azul e de economia azul;
b) incentivo à participação da sociedade nos temas relacionados à PMN e às ações dela decorrentes;
c) formação e aperfeiçoamento contínuo de recursos humanos para as atividades relacionadas aos ambientes marinho, costeiro e fluviolacustre; e
d) estímulo à inserção dos temas atinentes à PMN em todos os níveis educacionais para a formação de cidadãos críticos e conscientes da relevância dos ambientes marinhos, costeiros e fluviolacustres;
V – estimular a competitividade da frota mercante com bandeira brasileira e a participação de mão de obra brasileira, inclusive da mulher, nas atividades desenvolvidas nos ambientes marinho, costeiro ou fluviolacustre, conforme as seguintes orientações estratégicas:
a) desenvolvimento das estruturas aquaviária e portuária para que sejam eficientes, seguras, tecnologicamente inovadoras, ambientalmente sustentáveis, competitivas e integradas aos demais modais de transporte;
b) integração do transporte aquaviário nacional com os demais modais de transporte;
c) incentivo ao investimento privado e à otimização do emprego de recursos públicos na armação nacional;
d) estímulo à propriedade e ao registro de embarcações no País;
e) estímulo aos pescadores artesanais relativo aos usos múltiplos das águas; e
f) valorização e estímulo ao emprego de mão de obra brasileira e incentivo à inserção e à participação da mulher no desempenho das atividades desenvolvidas nos ambientes marinhos, costeiro e fluviolacustre;
VI – promover o parque industrial marítimo dos setores da construção, da manutenção, do reparo, da jumborização, da conversão, da modernização e do desmonte de embarcações e estruturas, conforme as seguintes orientações estratégicas:
a) incentivo à competitividade da indústria nacional de construção nas suas cadeias produtivas e nos serviços a elas relacionados;
b) incentivo à construção e à modernização de embarcações destinadas à pesca comercial e à indústria de processamento de pescado, respeitados os aspectos inerentes aos povos e às comunidades tradicionais marinhos e fluviolacustres; e
c) apoio à pesquisa, ao desenvolvimento, à inovação e à capacitação em tecnologias críticas ou sensíveis ao incremento e à competitividade do parque industrial nacional;
VII – estimular a pesquisa científica e tecnológica e a inovação, marinha e marítima, conforme as seguintes orientações estratégicas:
a) aprimoramento contínuo do ensino, por meio de cursos de extensão e de capacitação, dedicados aos estudos marítimos e marinhos;
b) difusão dos conhecimentos tradicional, científico, acadêmico e profissional relacionados às atividades desenvolvidas nos ambientes marinho, costeiro ou fluviolacustre e à segurança marítima;
c) integração e compartilhamento de dados e informações de pesquisas marítimas, marinhas e fluviolacustres;
d) incentivo à cooperação e ao intercâmbio científico nacional e internacional, relacionados às atividades de ciência, tecnologia e inovação marítimas, marinhas e fluviolacustre; e
e) estímulo à participação social e à integração entre os conhecimentos tradicional, científico e acadêmico, por meio de processos de ordenamento territorial sustentável;
VIII – incentivar a conservação e o uso sustentável da biodiversidade e dos ecossistemas marinhos, costeiros e fluviolacustres, conforme as seguintes orientações estratégicas:
a) fomento à adoção de medidas que contribuam para a promoção da saúde e da qualidade das águas interiores, da zona costeira e do ambiente marinho, incluídas ações de controle de poluentes, de despoluição do meio ambiente, para a conservação da biodiversidade marítima e a recuperação das espécies ameaçadas de extinção;
b) intensificação do monitoramento e da fiscalização da atividade pesqueira, especialmente em relação à pesca ilegal, não declarada ou não regulamentada;
c) controle, manejo e prevenção da introdução e da dispersão de espécies exóticas invasoras nos ambientes marinho, costeiro e fluviolacustre;
d) incentivo ao descomissionamento de estruturas marítimas ao término de seu ciclo de vida, com destinação final ambientalmente adequada, em atendimento aos princípios da reciclagem verde e da prevenção da poluição hídrica; e
e) estímulo à adoção de medidas necessárias à conservação da biodiversidade marinha e à recuperação das espécies ameaçadas de extinção;
IX – promover a integração das ações para o aproveitamento econômico de recursos, vivos e não vivos, marinhos, costeiros e fluviolacustres, de forma compatível com os princípios do desenvolvimento sustentável, conforme as seguintes orientações estratégicas:
a) estímulo à formação de arranjos inovadores entre a sociedade, as instituições acadêmicas e o poder público, nos termos do disposto no Decreto nº 10.531, de 26 de outubro de 2020;
b) aperfeiçoamento contínuo do aproveitamento sustentável dos recursos vivos e naturais para geração de energias renováveis, e dos recursos não vivos marinhos, costeiros e fluviolacustres;
c) promoção das sustentabilidades ambiental, cultural, social e econômica nas atividades pesqueiras e aquícolas, observadas as peculiaridades da pesca artesanal, de subsistência e da aquicultura familiar;
d) estabelecimento de sistemática nacional de coleta, registro e disseminação de informações relacionadas à mensuração das atividades relativas à economia azul; e
e) estímulo ao planejamento e ao ordenamento do espaço marinho, observados os princípios nacionais e internacionais que orientem práticas de governança adequadas e sustentáveis, e o arcabouço jurídico brasileiro relacionado aos processos de ordenamento dos ambientes marinho, costeiro e fluviolacustre; e
X – promover atividades turísticas, sociais, esportivas, recreativas e culturais que valorizem o uso do mar e das águas interiores, de forma sustentável e associadas ao empreendedorismo e à empregabilidade, conforme as seguintes orientações estratégicas:
a) estímulo ao planejamento e ao ordenamento territorial nas esferas federal, estadual, distrital e municipal, para apoiar as ações de caracterização e de gestão dos bens patrimoniais da União;
b) aperfeiçoamento contínuo do aproveitamento do mar e das águas interiores nos turismos náutico, ecológico, comunitário, de aventura, inclusive em unidades de conservação, observados os aspectos produtivos, socioambientais e as normas estabelecidas no plano de manejo da unidade;
c) adoção de medidas destinadas à implantação, à expansão, à modernização, à regularização e à fiscalização de infraestruturas e instalações de apoio à prática dos turismos náutico, aquático, esportivo e recreativo;
d) promoção do uso sustentável dos patrimônios natural, cultural, arqueológico e histórico subaquático;
e) desenvolvimento e valorização de práticas sustentáveis nas comunidades detentoras de bens culturais registrados como patrimônio cultural imaterial nacional;
f) estímulo à produção cultural associada ao mar e às águas interiores e sua divulgação; e
g) incentivo ao esporte, ao lazer e à prática de atividades físicas associadas ao mar e às águas interiores e sua divulgação.
CAPÍTULO III
DA IMPLEMENTAÇÃO E DA ARTICULAÇÃO COM OUTRAS POLÍTICAS
Art. 6º Na implementação da PMN pelos órgãos e pelas entidades da administração pública federal serão observadas:
I – a concorrência e a racionalidade das atividades econômicas relacionadas ao uso do mar e às águas interiores;
II – as melhores práticas regulatórias relacionadas ao uso do mar e às águas interiores;
III – a previsibilidade e a segurança jurídica para a realização de investimentos e a expansão da economia do mar e das águas interiores;
IV – a articulação interinstitucional para o aprimoramento do planejamento, da execução, do monitoramento e da avaliação das ações;
V – a compatibilização com as ações setoriais decorrentes de outras políticas públicas destinadas às atividades marítimas e marinhas;
VI – a promoção da integração e da articulação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios de forma sistêmica, coordenada e associada, para estimular a participação da iniciativa privada; e
VII – a avaliação de cenários prospectivos e recepção de outras normas compatíveis que venham a ser posteriormente editadas.
CAPÍTULO IV
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 7º O Ministro de Estado da Defesa poderá expedir atos complementares necessários à aplicação do disposto neste Decreto.
Art. 8º Fica revogado o Decreto nº 1.265, de 11 de outubro de 1994.
Art. 9º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 2 de junho de 2025; 204º da Independência e 137º da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
José Múcio Monteiro Filho
Presidente da República Federativa do Brasil
Fonte: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/decreto-n-12.481-de-2-de-junho-de-2025-633782891